Roberto Alban Galeria

Bahia, Contemporânea Bahia

Coletiva

Exposição29/Maio até 12/Julho, 2014

Bahia, contemporânea Bahia.

Evocar o nome de um lugar, um bairro, um estado, uma nação para organizar expressões artísticas se configura como estratégia política. Os lugares existem para além de quaisquer definições, mapas, fronteiras. Só precisamos dizer de onde somos para gerar algum tipo de negociação. Ao mesmo tempo, negar a representação de uma parcela identitária para os âmbitos da arte pode dificultar o processo de inserção de determinadas produções no escopo maior ao qual, por exemplo, denominamos arte brasileira. A nação, como afirmara Homi Bhabha, nos convém para preencher vazios, ocupar espaços.

A "fantasia de lugar", como qualquer fantasia, nos serve para ressaltarmos os traços distintivos, destacados, ornados e substituirmos a experiência de lugar, aquela que não se reduz, a imagens, canções, modos. O Brasil e a Bahia foram inventados como fantasia. Com todo empenho por narrativas épicas, precisamos dizer o que é um lugar, construí-lo como estratégia de afiliação, por mais que nem todos se identifiquem ou sejam identificados. Ao mesmo tempo, o que parece libertário pode se tornar amarra, cacoete, chiste se não deixarmos espaço para inovações, renovações, reinvenções.

A partir da metade dos anos 1980 e com franca intensificação nos anos 1990, a nomeação de lugares antes marginalizados entrara em cartaz nos principais museus e galerias do mundo. Pensava-se em conferir problematizações a tais fantasias: a África depois do modernismo, o Terceiro Mundo, a América Latina, o Islã. As exposições Primitivismo na arte do século XX, Magiciens de La Terre, Cocido y Crud, 24a Bienal de São Paulo (Antropofagia) mostraram que precisávamos incluir outras vozes, outros lugares, outros modos de ver e produzir arte contemporânea. Pensar o lugar é rever, primordialmente,  os resquícios formalistas e etnocêntricos, a partir de questões e de chaves conceituais identitárias, como a antropofagia.

A exposição Bahia, contemporânea Bahia, na galeria de arte Roberto Alban, segue este desejo de um modo muito mais específico: pensar a produção contemporânea a partir de artistas que trabalhem desde a Bahia. Não tencionamos afirmar traços específicos, maneirismos ou sotaques. Mas, sim, ativar a presença de um olhar multicultural que também atravessou esta produção, fazendo com que a história de cada artista selecionado tangenciasse em maior ou menor grau os influxos históricos: Almandrade convivera com Helio Oiticica e Paulo Brusky, Willyams Martins começara a produzir concomitantemente a eventos como a exposição que lançou pintores da Geração 80, Lara Viana estudara na Inglaterra nos centros acadêmicos que formaram Damien Hirst, Josilton Tom conviveu com os modernistas da terra e com os longos anos do importante Salão da Bahia. Mas, a história se renova e apresenta as produções de Március Kaoru, pensando na imigração japonesa em Salvador, Vinícius S.A. que expande corajosamente a apropriação dos objetos domésticos para as grandes instalações e Fábio Magalhães, cuja pintura ativa e dissimula possíveis aderências a imagens baianas. Ao mesmo tempo, temos a surpresa de poder contar com um interesse fotográfico e, ao mesmo tempo, instalativo e performático de Rosa Bunchaft que faz da fotografia uma experiência imersiva.

A formação destes artistas é de amplitude a ser notada. Alguns partem de convívios com escolas fora da Bahia e do Brasil, outros apresentam o contato com os eventos independentes, na maioria das vezes, em torno de exposições, grupos, orientadores.

O sistema de arte no Brasil, hoje, ainda está em construção. Por isso, uma exposição como a que nos dedicamos a realizar pode acontecer numa galeria comercial que, para a cidade de Salvador, terá a missão de suprir parte das lacunas institucionais. Hans Belting nos alertara que no momento em que os museus se tornaram tradicionalistas, as galerias abriram-se para ousadas proposições, basta lembrarmos das exposições O vazio, de Yves Klein, e O cheio, de Arman, respectivamente em 1958 e 1960, na galeria Iris Clert, em Paris.

Torna-se necessário, também, atualizar e rever o modernismo de longa duração que ainda predomina em grande parte do Brasil. Sim, é a hora de pensarmos o contemporâneo, por mais problemático que seja o termo,  para que possamos recodificar materiais e métodos, poéticas e imagens, abrindo caminho para os que se aventuram.

 
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